segunda-feira, 25 de abril de 2011

A filosofia vai ao cinema (e regressa às aulas com ideias novas)




Vou estar em Évora para proferir uma palestra sobre a utilização do cinema como recurso didáctico nas aulas de filosofia, a convite do Departamento de Filosofia, Escola de Ciências Sociais, da Universidade de Évora. No dia
 27 de Abril, pelas 11 horas, na sala 131 do Colégio do Espírito Santo. A entrada é livre.
Depois conto como correu.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Um livro, um filme, uma letra de música, uma notícia... Como fazer um artigo de crítica filosófica?

Filosofar é pensar por si mesmo, de forma pessoal e crítica

Há três anos que exijo aos meus alunos que façam um artigo de crítica filosófica de cerca de uma página a partir de algo por eles escolhido: um livro, um filme, uma peça de teatro, uma letra de música, uma notícia, etc. 
Entre outras coisas, pretendo com isso que os alunos apliquem as competências de crítica filosófica ao que lêem, vêem ou ouvem no seu dia a dia. Que olhem para o mundo que os rodeia com um olhar crítico, portanto. 
Aqui ficam as "instruções" que lhes forneço.


1. O QUE É UM ARTIGO DE CRÍTICA FILOSÓFICA?

É um texto onde se faz análise e crítica filosófica a partir de um livro ou filme, por exemplo. Deve ser claro, crítico e pessoal. E também deve ser sintético, porque um artigo, para ser publicável, deve respeitar o limite de palavras que o editor normalmente exige. E o espaço nos jornais é raro e valioso.

2. COMO ME PREPARO?

Escolhe sobre o que vais escrever: livro, filme, poema(s), letra(s) de música, etc. Informa o teu professor (eu, neste caso), para que ele te possa orientar. Escreve uns tópicos sobre as ideias principais que queres transmitir. Selecciona algumas frases curtas relevantes (se for um livro), ou cenas e diálogos especiais (se for um filme).

3. QUE ASPECTOS DEVE O ARTIGO TRATAR OBRIGATORIAMENTE?

O artigo deve incluir obrigatoriamente duas coisas: 1- uma breve e esclarecedora apresentação do texto ou filme escolhido e 2- uma abordagem da sua relevância filosófica. O mais importante é este último, que pode ser realizado de variados modos, como por exemplo: identificar e clarificar problemas, teses, argumentos ou objecções detectáveis no texto ou filme, com ou sem avaliação pessoal (não é obrigatório apresentares a tua opinião).

4— CARACTERÍSTICAS DO ARTIGO

O artigo deverá ocupar uma página A4, com corpo de letra 11, texto justificado e espaçamento 1.0 ou 1.5. O cabeçalho deve incluir o nome, nº e turma do autor do artigo, o título atribuído e a identificação do texto ou filme abordado.  Exemplo:

É MORALMENTE ERRADO MENTIR POR AMOR?

Textos utilizados: letras das músicas Pasíon (Rodrigo Leão) e Lie To Me (Chris Isaak)

Maria dos Santos, 10º Y, nº 21

Se necessário, o verso da página pode ser utilizado para anexar o(s) texto(s) analisado(s) ou a ficha técnica do filme.

5 — TRÊS CONSELHOS PRÁTICOS

1. Sê pessoal: o artigo deve ter a tua «marca», com o teu «estilo» e forma de pensar; 2. Sê ousado: tem a coragem de seres tu próprio(a); 3. Pensa bem antes de escrever: o artigo não é um teste feito no momento — tens tempo mais do que suficiente para o fazer…

É moralmente errado mentir por amor? A propósito de Pasíon (Rodrigo Leão) e Lie To Me (Chris Isaak)



É MORALMENTE ERRADO MENTIR POR AMOR?

Textos utilizados: letras das músicas Pasíon (Rodrigo Leão) e Lie To Me (Chris Isaak)


            A maior parte das pessoas considera que é errado mentir. Mas algumas delas pensam que há situações em que mentir não é errado, alegando que se tratam de excepções à regra. Será mentir por amor uma dessas excepções?
Nas letras das músicas Pasíon e Lie To Me a mentira tem um papel central. Em Lie To Me, alguém que é infiel debate-se com um sentimento de culpa que, ao que parece, não é suficiente para o levar a deixar de mentir. "Não interessa o que as pessoas possam dizer, eu sei que todos mentem", afirma, talvez desculpando-se, dando a entender que se trata de uma mentira piedosa, para não fazer sofrer alguém que o ama, porque as coisas que faz "despedaçam-lhe o coração". Em Pasíon, diferentemente, é a própria pessoa apaixonada quem pede à pessoa amada que lhe minta e a ame. "Ah, abraça-me esta noite / E ainda que não te apeteça / Prefiro que me mintas", diz ela (ele?) apaixonadamente.  
            Em ambos os casos a mentira surge como algo que parece ter "justificações" que escapam à esfera da moral, provavelmente por se considerar que os sentimentos e a razão são de natureza diferente. Ou, como escreveu um dia Pascal, o célebre cientista e filósofo francês do séc. XVII, "o coração tem razões que a própria razão desconhece".
            O problema filosófico aqui presente é o de saber se mentir por amor constitui uma excepção à regra moral de não mentir. Vou comparar duas posições sobre este assunto.
            Friedrich Nietzsche, filósofo alemão do séc. XIX, considerava que as regras morais eram negativas para o Homem, porque o inibiam de viver a vida em toda a sua intensidade. Para ele, as noções de Bem e de Mal são arbitrárias e falsas. O amor, em contrapartida, é algo de inequivocamente verdadeiro. "O que se faz por amor está para além do bem e do mal", escreveu um dia, tornando claro deste modo que, em sua opinião, nada de errado existe em mentir por amor.
Immanuel Kant, filósofo alemão do sé. XVIII, defendeu a posição oposta. Na sua opinião, a dimensão humana mais importante não é o desejo ou a paixão, mas a razão humana. E a razão humana indica-nos o que devemos fazer, ainda que não nos apeteça. Ora, uma vez que os deveres são iguais para todos os seres humanos (são universais), é moralmente errado abrir excepções para as regras morais, seja em que circunstâncias for. Neste caso em particular, Kant diria que, por muito piedosa ou bem intencionada que fosse, a mentira continuaria a ser moralmente errada. Esta posição enquadra-se na ética deontológica e opõe-se à perspectiva utilitarista, que defende que uma acção é moralmente boa quando proporciona o máximo de bem estar para o maior número possível de pessoas, ou seja, quando as consequências são as melhores possíveis. Para Kant, pelo contrário, a utilidade ou inutilidade são moralmente irrelevantes, uma vez que “o valor moral da acção não reside, no efeito que dela se espera.”
            De um ponto de vista filosófico, a tentativa de resolução deste problema exige que façamos algumas clarificações. Em primeiro lugar, é necessário responder à pergunta: é moralmente errado mentir, seja em que circunstâncias for? Se se considerar que há circunstâncias em que mentir não é errado, a questão seguinte a resolver é a de saber se a mentira no amor é uma dessas circunstâncias. Se a resposta for afirmativa, há outras perguntas que temos de fazer: nenhuma mentira dita por amor é errada? Apenas algumas? Se sim, que tipo de mentira feita por amor é moralmente aceitável e que tipo é que não é?
            Fica lançado o desafio.

LETRAS UTILIZADAS:
  • Pasión


    Música: Rodrigo Leão / Letra: Ana Carolina

    No me olvides
    Que me muero
    Amor, mi vida, sufrimiento
    Yo, te quiero en mi camino
    Por vos, cambiava mi destino

    Ay, abrázame esta noche
    aunque no tengas ganas
    prefiero que me mientas
    tristes breves nuestras vidas
    acércate a mí
    abrázame a ti por Dios
    entrégate a mis brazos.

    Tengo, un corazón penando
    Yo sé, que vos lo estas escuchando
    Con, mil lagrimas te quiero
    Pasión, sois mi amor sincero

    Ay, abrázame esta noche
    aunque no tengas ganas
    prefiero que me mientas
    tristes breves nuestras vidas
    acércate a mí
    abrázame a ti por Dios
    entrégate a mis brazos

    • Lie To Me

    There is a woman, far over the sea.
    Standing and waiting, praying for me.
    Here I lie sleeping, a girl by my side.
    Who am I hurting, each time I lie?
    Lie to me, lie.....
    Lie to me, lie.....
    There is a woman, trying hard to be brave.
    The way that I hurt her, has made her afraid.
    Things that I'm doing, are breaking her heart.
    Still she's pretending, that we'll never part.
    Lie to me, lie.....
    Lie to me, lie.....
    I don't care what people may say, I know everybody lies.
    I'm not trying to hurt my love, I'm only trying to get by.
    There is a woman, far over the sea.
    Standing and waiting, praying for me.
    Here I lie guilty, a girl by my side.
    Who am I hurting, each time I lie?
    Lie to me, lie.....
    Lie to me, lie.....
    Lie to me, lie.....
    Lie to me, lie.....